• Edição 166
  • 02 de abril de 2009

Por uma boa causa

Verminose pode causar problema neurológico

Beatriz da Cruz

Quando ouvimos a palavra “verme”, logo nos vem à mente um ser nocivo, pegajoso e rastejante. Na realidade, verme é uma designação utilizada para invertebrados dos filos Platelminto, Nematelminto e Anelídeo. Embora alguns possam causar doenças e parasitar tanto humanos quanto animais, outros nos podem ser muito úteis, como é o caso da minhoca para a agricultura. O Por uma boa causa deste mês vai abordar alguns desses seres.

Também conhecida pelo nome de solitária, a tênia é um parasita que ao se alojar no intestino delgado causa uma doença denominada teníase. As que parasitam humanos podem ser de dois tipos: a tênia solium, cujo contágio se dá através da carne de porco, e a tênia saginata, que se dissemina através da carne de boi.

De acordo com Regina Moreira, professora de doenças infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da UFRJ, as duas apresentam diferenças morfológicas discretas na fase adulta. Porém, a diferença mais importante entre elas é em relação ao tipo de doença que podem desencadear. Embora ambas causem teníase, a tênia solium em particular causa ainda uma segunda doença.

Contágio

A contaminação se dá através da ingestão de cisticercos presentes na carne do hospedeiro intermediário. “O boi, por exemplo, ingere o ovo da tênia, que circula pelo seu corpo e se aloja no tecido muscular permanecendo lá sob a forma de cisticerco, que é uma larva não desenvolvida”, explica Regina. Se a carne não for bem cozida e bem preparada, especialmente em lugares onde não haja uma boa vigilância sanitária, o homem pode acabar ingerindo o cisticerco, que se desenvolve em tênia.

Segundo a professora, em humanos, a tênia se fixa na parede do intestino e compete pela absorção de nutrientes, podendo piorar casos de subnutrição e eventualmente causar dores abdominais. Apesar de ser um verme único, por isso sendo também chamada de solitária, a tênia é grande, podendo atingir mais de um metro de comprimento.

A identificação da doença pode ser feita pela própria pessoa ou por exame de laboratório. “A tênia elimina, na extremidade livre, pedacinhos chamados de proglotes. Essas proglotes podem ser observadas misturadas às fezes, no caso de infecção pela tênia solium, e, no caso da tênia saginata, podem sair e ficar na roupa íntima da pessoa, o que é também outra diferença entre as duas espécies”, aponta a professora.

Caso haja suspeita da doença, a pessoa deve procurar um médico e recorrer a um exame de fezes chamado tamização para detectar a doença. Após o diagnóstico, o tratamento é feito por via oral e a tênia é expulsa através do ânus, sem maiores problemas. Deve-se, entretanto, ter atenção para verificar se o verme saiu por inteiro, já que a tênia pode se regenerar.

Cisticercose

No caso da tênia solium existe ainda outro perigo. Caso os ovos dessa espécie sejam ingeridos em vez da larva, a pessoa pode desenvolver a cisticercose humana. “Esse ovo ao ser ingerido vai para a circulação podendo se alojar em vários locais. Pode ser no olho, no músculo, no coração ou no pulmão, mas o maior perigo é quando atinge o cérebro”, alerta a médica. Como o ovo fica dentro da proglote, caso a pessoa tenha a tênia no intestino, refluxos gastrintestinais podem levar a proglote ao estômago. Lá o suco gástrico, que contém ácido clorídrico, deteriora a proglote e o ovo no estômago é absorvido pela circulação. Essa é outra forma de adquirir cisticercose, através da regurgitação.

— Por ser um órgão nobre, qualquer coisa que se instale no cérebro, no sistema nervoso central, pode dar problema. Nesse caso, a doença se chama neurocisticercose, e funciona como um tumor, só que causado por um parasita — esclarece Regina. A neurocisticercose pode ser fatal, porém o mais comum é provocar sintomas como convulsões, ataques epiléticos e déficit motor.

O diagnóstico da doença faz-se através de uma tomografia, que identifica com facilidade o problema. “O cisticerco, no cérebro, se desenvolve até determinado ponto, mas não consegue os meios adequados para sobreviver, então morre. Na cisticercose a larva pode estar viva ou morta, em ambos os casos há sintomatologia”, ressalta a especialista.

Trata-se de um corpo estranho no organismo. Portanto, causa irritação e inflamação, e no olho pode levar à cegueira. “Uma vez diagnosticado, o tratamento da neurocisticercose é feito por via oral com o mesmo medicamento utilizado no combate à teníase, porém o tempo de uso é mais prolongado. Geralmente se inicia o tratamento com o paciente internado e em observação”, diz Regina. De acordo com ela, eventualmente pode haver necessidade de neurocirurgia, mas são raros os casos em que a intervenção é necessária.

A professora explica ainda que no caso da neurocisticercose, após o tratamento, pode haver sequelas. “As células do cérebro não se regeneram, então uma inflamação muito grande ou por muitos cisticercos pode deixar sequelas permanentes. A principal delas é a crise convulsiva”, conclui a médica.

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