• Edição 190
  • 24 de setembro de 2009

Por uma boa causa

Computador e celular: o que acontece sem eles?

Amanda Salles

Encerrando a série de reportagens do Por uma boa causa do mês de setembro, que abordou os mais comuns e mais recentes tipos de fobia, esta edição traz por tema a fobia diante das novas tecnologias. Celular, computador, Ipod. Não adianta negar, a sociedade moderna se tornou dependente desses aparelhos. Seja por uma questão profissional, por hobby, por necessidade de se manter informado e conectado a todo tempo. Quando isso passa a ser uma obsessão, o grande problema aparece.

Nomofobia, que vem do inglês "no mobile", foi o nome dado para a doença que causa pânico e angústia na falta do celular. Mas o celular é apenas uma das tecnologias sem as quais algumas pessoas, literalmente, não sobrevivem. Há quem não passe um minuto sem o computador, o e-mail, a internet, tornando-se, assim, reféns do mundo moderno.

Segundo Pedro Paulo Bicalho, coordenador do programa de extensão Núcleo Interdisciplinar de Ações para a Cidadania (NIAC) e professor do Instituto de Psicologia da UFRJ, há também quem tenha uma atitude de afastamento e medo de usar os novos aparelhos por não saber controlá-los, mas o que interessa para a psicologia é a questão do incômodo que essa fobia causa no sujeito, não importa sob que ponto de vista.

Assim como a maioria das fobias, o medo excessivo das novas tecnologias ou a Tecnofobia só é percebido quando passa a afetar a vida social e profissional do fóbico. Sentir-se ansioso ou nervoso quando acaba a bateria do celular ou quando o esquece em casa, não conseguir ir para algum lugar sem celular ou acesso à internet, por achar que alguma coisa pode acontecer e por não querer perder informação, sentir-se mal quando não há tempo para verificar um e mail. Essas são algumas das situações e atitudes de pessoas que sofrem com esse tipo de fobia.

A dependência não é o único problema. O prejuízo na vida social e profissional dos pacientes é enorme. Uma pesquisa realizada pela Universidade de Glasgow, na Escócia, revelou que a grande quantidade de e-mails interrompendo constantemente o trabalho, estressa os profissionais. Na tentativa de verificar as mensagens, eles se sentem mais cansados, frustrados e menos produtivos. Além disso, em algumas empresas, é proibido usar o celular, pois seus responsáveis perceberam que algumas pessoas usam o aparelho o dia inteiro, o que prejudica a realização das atividades. No Brasil, usar e-mail para fins pessoais pode ocasionar demissão por justa causa. A maioria dos tribunais reconhece o direito das empresas de fiscalizar o uso do e-mail fornecido ao funcionário como ferramenta de trabalho e utilizar as informações como prova em ações judiciais. Permite, ainda, que as empresas bloqueiem sites e programas de bate-papo.

A questão do desenvolvimento de uma sociedade voltada para o consumo e da subjetividade tem grande influência nesses casos. Antigamente, muitas pessoas conviviam muito bem sem celular e sem internet. “O celular não venderia tanto como hoje, caso antes de seu lançamento, não fosse gerado um sentimento de desejo por este aparelho. A subjetividade é a matéria-prima de toda e qualquer produção e para o lançamento de qualquer coisa no mercado. Hoje, há a necessidade de criar o desejo de consumo nas pessoas. Em função disso, assim como a produção de desejo, gera-se a produção do incômodo nas pessoas, tanto para as que utilizam as tecnologias de maneira excessiva, quanto para as que não sabem e por isso têm medo de acessar. O importante para a psicologia é destruir a idéia de doença e construir o pensamento de que essa fobia é uma consequência do papel de sujeito na sociedade contemporânea”, explica Pedro Paulo Bicalho.

O fato de a maioria dos pacientes não acreditar que sua dependência possa ser uma doença é outro sintoma dela mesma. As fobias relacionadas às novas tecnologias são muito novas e pouco diagnosticadas, já que as pessoas não as enxergam como doenças, pois, na vida moderna, ficar “plugado” o tempo todo virou uma atitude comum. Além disso, passar o dia inteiro na internet pode fazer com que a pessoa deixe de viver a vida real. Ela passa a possuir muitos contatos virtuais e somente alguns físicos, muitas vezes, abdicando até mesmo do convívio com a família e vivendo só em função daquela determinada tecnologia.

O tratamento para a fobia em relação às novas tecnologias é feito em grupo. O Núcleo Interdisciplinar de Ações para a Cidadania (NIAC) da UFRJ possui um grupo terapêutico especializado em pessoas com problemas desse tipo de fobia, onde acontecem discussões sobre como a tecnologia provoca o sofrimento e de que maneira isso pode ser mudado.

Segundo Pedro Paulo Bicalho, a família, os amigos e, muitas vezes, a empresa em que o fóbico trabalha não devem banalizar o fato de pessoa se sentir mal por isso. Eles devem incentivar a procura por um tratamento psicológico, caso a pessoa mesmo não aja a seu favor. O reconhecimento da fobia é o maior desafio.

Para ter acesso aos grupos do NIAC é preciso comparecer aos plantões que acontecem de segunda à sexta, de 13:30h às 16:30h, no Fundão. Os pacientes serão direcionados para um atendimento em conjunto, por estagiários de Direito, Psicologia e Serviço Social que decidirão o encaminhamento necessário.