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Edição 195
29 de outubro de 2009

Microscópio

Conhecer as interações marinhas: um meio de salvar a natureza



Cília Monteiro

Entender as interações entre a Antártica e a América do Sul no ambiente marinho é extremamente importante nos dias atuais. “Precisamos conhecê-las melhor, para ampliarmos nossa capacidade de predição do futuro em função das mudanças ambientais globais: não só em relação ao clima, mas também ao aumento do ‘buraco do ozônio’ e outros processos de causa humana. É preciso gerar medidas para minimizar as consequências dos impactos que essas alterações trazem”, explica Lúcia de Siqueira Campos, professora do Instituto de Biologia da UFRJ.

Segundo Lúcia, a América do Sul foi o último continente a se separar da Antártica, há aproximadamente 35 milhões de anos. Quando isso ocorreu, formou-se o Oceano Austral, que corresponde a cerca de 10% de todos os oceanos. “Com a formação, foi gerada a corrente circumpolar e também a Frente Polar, uma barreira natural que impede muitos organismos de entrarem ou saírem da região antártica”, observa a professora.

De acordo com ela, durante o inverno, o gelo marinho estende-se por mais de 20 milhões de quilômetros quadrados. Já no verão, reduz-se a 7 milhões de quilômetros quadrados . “Essa formação, e o derretimento de gelo marinho, é um dos principais mecanismos que provocam a circulação das grandes correntes oceânicas do planeta. Águas ricas em nutrientes e oxigênio são bombeadas, a partir da região antártica, a milhares de quilômetros de distância em direção ao hemisfério norte. Isso fertiliza águas de superfície em alguns locais do planeta fora da Frente Polar”, aponta Lúcia.

Essas águas enriquecidas favorecem a produtividade nas áreas onde ressurgem. “Mas também é possível que, ao longo do tempo, no trajeto de circulação das massas de água profunda, as condições sejam propícias à dispersão de organismos, a partir da região antártica, para outras partes do planeta. Mas o contrário ainda pode ser verdadeiro nas profundidades nas quais massas de água provenientes do norte chegam mais aquecidas na região antártica. Ou seja, a barreira natural gerada pela Frente Polar parece funcionar para organismos que vivem em regiões mais rasas ou águas mais superficiais”, indica a professora.

Já nas zonas profundas, a história geográfica dos organismos parece ser diferente e pode estar relacionada à maneira como fluem as massas de água. “Pela proximidade da América do Sul com a Antártica, torna-se muito importante conhecer bem todos os processos que possam implicar a maior ou menor fertilidade dos nossos oceanos. E existem hoje evidências de espécies que são compartilhadas entre as duas regiões”, expõe a pesquisadora.

Lúcia explicou que a região da Península Antártica, a de maior proximidade da América do Sul, é a que mais está sofrendo com o aquecimento global. “A retração de geleiras nesta região tem sido bastante acentuada. Não estou falando do gelo marinho que naturalmente se forma e derrete todos os anos, mas de gelo formado há milhares de anos ou que esteja sobre o ambiente terrestre, que também está derretendo. Com menos gelo, menor é a reflexão e maior a absorção de energia solar no ambiente, provocando mais aquecimento e mais derretimento. Ao longo do tempo, isso significa que, durante o inverno, nem sempre há tanta formação de gelo marinho”, relata.

No ambiente marinho antártico, o gelo é extremamente importante para o aumento da produção de microalgas. “Quando há menos gelo gerado durante o inverno, há menos microalgas e krill durante o verão, o que significa menos alimento para aves e mamíferos. Anos com menor produção de krill podem implicar um retardamento no deslocamento das baleias, que devem migrar para se reproduzirem”, constata a professora.

A circulação de massas de água ocorre numa escala de tempo diferente da dos ciclos de vida dos animais e plantas. “Por isso precisamos conhecer melhor suas formas de reprodução e a distância genética entre espécies que ocorrem na Antártica e na América do Sul. E, a longo prazo, em função das mudanças ambientais, saber as chances de sobrevivência desses organismos nas duas regiões”, afirma a pesquisadora.

Simpósio em Ecologia

Para uma discussão acerca do tema, será realizado, nos dias 5 e 6 de novembro, o VI Simpósio em Ecologia: Interações entre a Antártica e a América do Sul no Ambiente Marinho (Antarctic-South American Interactions in the Marine Environment). “Este evento foi promovido por vários órgãos de fomento, inclusive a própria UFRJ, mas idealizado através de atividades do Censo de Vida Marinha (Census of Marine Life – CoML)”, especifica Lúcia.

O Simpósio reúne pesquisadores brasileiros e estrangeiros de renome, que atuam nos vários domínios marinhos. “Além de gestores dos Ministérios da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e dos Programas Antárticos Sul-Americanos”, acrescenta Lúcia Campos.

O evento acontece a partir das 8h no auditório do Roxinho, do Centro Cultural Professor Horácio de Macedo (CCHM), localizado no Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN) da UFRJ. O endereço é Avenida Athos da Silveira Ramos, 149, Cidade Universitária.

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