• Edição 166
  • 02 de abril de 2009

Microscópio

A medicina e os aspectos legais

Monike Mar – Agn/Pv

Como deve ser tratada a pessoa com problema mental ou transtorno de conduta que comete um delito? Em primeiro lugar, a avaliação do paciente, que por lei não pode receber punição, fica a cargo da Psiquiatria Forense, que Flavio Jozef, professor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, define como “interface da psiquiatria e a lei. A Justiça vai se socorrer com a psiquiatria para lidar com as questões pertinentes”, diz.

Flavio Jozef participa do Programa de Ensino e Pesquisa em Psiquiatria Forense, da UFRJ, em que são realizadas atividades de pesquisa e prática, como atendimento ao público, a partir de avaliações periciais para a Justiça. Ele destaca a importância da pesquisa nesse ramo da psiquiatria, uma vez que há muitas publicações científicas que envolvem estudos de populações homicidas, estupro, violência doméstica, abuso sexual infantil, entre outros.

Essas e outras questões serão abordadas esta semana no Instituto de Psiquiatria da UFRJ, onde acontece o Simpósio de Psiquiatria Forense na Atualidade. Serão debatidos em quatro mesas-redondas temas como criminalidade, psicopatia, pedofilia e doenças mentais, relacionados a aspectos legais. Além disso, serão oferecidos dois cursos voltados para estudantes e profissionais de Saúde e Direito. O simpósio conta com o apoio da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ) e da Associação Psiquiátrica do Estado do Rio de Janeiro (APERJ).

Tratamento?

O professor Flavio Jozef mostra-se pessimista em relação às formas de tratamento no Brasil:
— A questão não é tratamento, porque nem sempre estamos lidando com doenças. Na verdade, precisamos desenvolver o campo de conhecimento de populações violentas. No nosso país, no âmbito das prisões, estamos muito atrasados. Estamos longe de pensar em propostas de tratamento como acontece em países de primeiro mundo. Aqui, as formas de se lidar com essas pessoas estão ligadas à recuperação e à punição, esta última principalmente — declara o professor, que aponta como erro estrutural do Brasil a vinculação de hospitais penitenciários a instituições judiciais, como as outras prisões. Segundo Jozef, este é um “detalhe administrativo que demonstra a nossa cultura de segurança”, que vai de encontro ao que acontece na Inglaterra, Estados Unidos e Finlândia, por exemplo.

Monique Pereira, aluna da Escola de Comunicação da UFRJ, desde o segundo semestre do ano passado participa de atividades no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho, após eleger os pacientes como tema de um trabalho de conclusão da disciplina de fotojornalismo.

— Pelo que pude perceber, no tratamento ainda existe uma cultura muito criminalizante. Uma das principais deficiências é a contratação de profissionais que trabalhavam em unidades carcerárias, tratando os internos como pessoas normais. Deveria haver preparação específica para lidar com pacientes que por muitos são vistos como criminosos — diz a estudante.
Monique verificou de perto a realidade de quem sofre de transtornos mentais dos mais variados graus de manifestação. Ao Olhar Vital ela conta um pouco da sua experiência:

— No hospital, convivendo com pessoas de vários níveis sociais com diversos tipos de doenças, de alta ou baixa gravidade, vejo que a minha melhor experiência foi saber que essas pessoas têm sonhos, muito a ensinar e muitas histórias para contar. Por isso a criminalização deve ser repensada, porque não se pode impedi-las de viverem como nós.

Portanto, com a ausência de políticas que transformem o sistema prisional de modo geral no país, é importante a iniciativa de se debater as questões com profissionais da área de psiquiatria e direito, que segundo Jozef têm grande interesse na área da psiquiatria forense. A criminalização hoje é o principal problema, e pensar em manicômios e prisões intensifica a dificuldade de reabilitação das pessoas à sociedade.