• Edição 252
  • 24 de março de 2011

Argumento

O crack e a necessidade de políticas públicas de amplo espectro

Marcelo Dantas

Apesar de não se terem dados concretos sobre a realidade do consumo de crack no Brasil, sabe-se que a droga se espalhou no país de modo que especialistas, a partir do final da década passada, já pudessem a considerar uma epidemia. Segundo aponta uma recente pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Municípios, a droga já é consumida em 98% das cidades brasileiras.

O crack, droga feita a partir da mistura de pasta de cocaína com bicarbonato de sódio, chega ao organismo do usuário através da fumaça produzida pela queima de uma espécie de pedra da droga. A fumaça produzida chega ao sistema nervoso central em cerca de dez segundos, devido ao fato de a área de absorção pulmonar ser muito grande. Seu efeito, que altera estados de euforia superiores ao do uso da cocaína seguidos de profunda depressão, dura de 3 a 10 minutos, o que leva o usuário a usar novamente a droga para compensar o mal-estar, provocando intensa dependência. O crack é uma droga barata e, apesar de seu consumo estar diretamente associado às camadas mais pobres da população, há usuários de todas as classes sociais.

No dia 17 de fevereiro, a presidenta Dilma Rousseff prometeu uma “luta sem quartel” contra o crack. Um projeto desenvolvido pela Secretária Nacional de Políticas sobre Drogas prevê a implantação de 49 Centros Regionais de Referência em Drogas em universidades federais. As unidades serão responsáveis por capacitar, em um ano, 14,7 mil profissionais, como médicos, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais e agentes comunitários.

Para o médico neurologista e professor José Mauro Braz de Lima, o crack pode demonstrar, mais incisivamente, que a questão das drogas não pode ser resolvida ao se assumir a visão de mera criminalização do usuário. Segundo o professor, a dependência de substâncias químicas é uma questão ampla que envolve saúde pública, questão judiciária e estrutura social, e que também não deve ser tratada apenas com usuário, mas também com seus familiares e laços mais próximos.

Citando Freud em O mal-estar da Civilização, José Mauro esclarece que o consumo de drogas está essencialmente associado, mais do que à busca pelo prazer, à “fuga do desprazer”. E, como o desprazer é inerente a todo indivíduo ou grupo coletivo, o que deve ser buscado e incentivado, como forma de se evitar o direcionamento para as drogas, são caminhos diversos que possam reduzir esse mal-estar como, por exemplo, o trabalho e a arte.


José Mauro é coordenador geral do Centro de Ensino, Pesquisa e Referência de Alcoologia e Adictologia (Cepral), um programa acadêmico da Universidade Federal do Rio de Janeiro que visa a tornar-se Centro de Referência e de Excelência na atenção integral aos Problemas Relacionados ao Uso, Abuso e Dependência do Álcool e outras drogas (PRAD), contemplando as atividades de ensino, pesquisa, extensão e assistência aos usuários e familiares.