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Edição 192
08 de outubro de 2009
Após dois anos de debates entre diversos especialistas e entidades da classe médica, que propuseram 2.677 sugestões, no último dia 24 foi publicado no Diário Oficial da União o novo Código de Ética Médica. Entre as suas principais recomendações estão a proibição de criar embriões humanos para pesquisa e de escolher o sexo do bebê nas clínicas de reprodução assistida. Também devem ser garantidos a autonomia do paciente, o seu direito à informação sobre a própria saúde e as decisões do tratamento, com destaque para os cuidados paliativos referentes a pacientes com doenças incuráveis ou em estado terminal.
O código ainda prevê que os médicos não devem se submeter à pressão de clínicas e hospitais para atenderem o maior número de pacientes por jornada de trabalho. E não podem vender medicamentos ou receber gratificação da indústria farmacêutica por indicação de remédios, além de esclarecerem se são patrocinados em palestras e trabalhos científicos.
De acordo com o doutor Gérson Carakushansky, professor - titular da Faculdade de Medicina da UFRJ e organizador do Serviço de Genética Médica do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG/UFRJ), “já houve quem afirmasse que se todos os profissionais, independentemente das suas áreas de atuação, agissem em consonância absoluta com seu código de ética, estaríamos vivendo num mundo ideal”.
O último Código de Ética Médica datava de 1988 e já se encontrava defasado. Nestes pouco mais de 20 anos, além dos diversos avanços técnico-científicos, o quadro da saúde no Brasil sofreu significativas alterações, com destaque para a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e aumento do número de planos de saúde e de intermediários entre o médico e o paciente.
Para o doutor Gérson, é “notória e crescente a mercantilização da Medicina”. E o objetivo de um código de ética é o de tentar regular e legitimar normas de condutas consideradas corretas. “Na área médica, uma finalidade importante do código é a de colaborar com os profissionais que lutam em prol de uma atenção à saúde mais humanizada”, esclarece.
Pesquisas com embriões humanos
Tendo em vista que segmentos da sociedade têm se mostrado contrários à destinação de embriões humanos para fins de pesquisas com células-tronco, recentemente foi aprovada a Lei de Biossegurança, que garantiu que pesquisadores retomassem pesquisas com células-tronco embrionárias. Porém, sob as condições de que os embriões estejam congelados há mais de três anos em laboratórios de clínicas de reprodução assistida e que sejam cedidos com autorização do casal responsável pelos embriões.
“Como médico geneticista, tenho tido a oportunidade de testemunhar no meu dia a dia o drama dos pais de crianças que nascem com um dos vários tipos de distrofias musculares hereditárias. Não sou favorável à criação de embriões destinados somente à pesquisa, mas sim apenas ao aproveitamento para pesquisa daqueles embriões congelados há mais de três anos e destinados a descarte nas clínicas de fertilização – afirma o geneticista.
Escolha do sexo dos bebês
Alguns médicos defendem a escolha do sexo dos bebês somente em casos especiais, nos quais se deseje evitar o nascimento de crianças com doenças genéticas graves que são transmitidas através de uma herança ligada ao sexo.
“Não acho nada correta a banalização dos tratamentos de reprodução assistida, a ponto de as pessoas acharem que não tem nada de errado o fato de ir a uma clínica de reprodução para gerar uma menina ou um menino com a mesma naturalidade com que se vai a um supermercado para fazer compras”, evidencia Carakushansky.
O doutor ainda menciona a possibilidade de tal prática produzir graves desequilíbrios populacionais. “O que realmente aconteceu na China, onde a maioria dos casais só tem um descendente, e o aborto seletivo de fetos do sexo feminino já criou naquele país uma desproporção sexual gigantesca em favor do sexo masculino”, constata.
Medicina paliativa
A evolução da Medicina tornou a vida cada vez mais prolongada e inaugurou um novo contexto. A morte nem sempre constitui apenas um episódio, mas um amplo e complexo processo, que pode se estender por dias ou até mesmo anos. Deste modo, os cuidados paliativos se tornam imprescindíveis e a sua garantia foi destacada pelo novo Código de Ética Médica.
“ Esses cuidados não pretendem antecipar e nem postergar a morte, mas sim promover o alívio da dor e de outros sintomas estressantes. E oferecer um sistema de suporte que auxilie o paciente a viver tão ativamente quanto possível, prevenindo uma morte caótica e com grande sofrimento”, – conclui o doutor.