Um grupo de pesquisadores do Laboratório de Genética Molecular Vegetal, do Instituto de Biologia da UFRJ, desenvolve diversas linhas de pesquisa ligadas ao mecanismo de defesa das plantas, à regulação da expressão gênica e ao estudo de vírus vegetais. Um desses estudos, que inclusive será destaque do XX International Congress on Sexual Plant Reproduction, realizado no mês de agosto em Brasília, busca compreender e controlar a reprodução de vegetais geneticamente modificados.
- Trabalhamos com duas linhas básicas de pesquisa. Uma delas está relacionada à reprodução vegetal, que se subdivide em várias teses de mestrado e doutorado. Outra linha trabalha com o estresse hídrico (em situações de pouca água ou de seca) em plantas -, explica Márcio Alves-Ferreira, professor do Instituto de Biologia.
Em relação à seca, o grupo trabalha com o café. O objetivo principal desta pesquisa, iniciada em 2005, é estudar os genes expressos no cafeeiro, que potencialmente podem se envolver com a resistência ao estresse hídrico. “Queremos encontrar estes genes, determinar suas funções, ajudar em programas de melhoramento genético clássico e também possibilitar a introdução destes genes, através de transgênese, no cafeeiro”, afirma o professor. No Brasil existem duas variedades de café: a arábica, mais saborosa, e a canéfora, utilizada no café solúvel. Em períodos de pouca chuva, a queda na produção chega a mais de 40%. Como o Brasil é o maior exportador de café do mundo, faz-se necessário compreender este mecanismo de tolerância para aumentar a eficiência dos cafeeiros e diminuir o consumo de água também. A agricultura consome 70% de toda a água doce do mundo.
- Nossas pesquisas com reprodução de plantas se iniciaram há mais de dez anos, e atualmente envolvem cinco alunos do laboratório. O objetivo central é de entender mais os princípios básicos desta reprodução. Nos vegetais, a parte feminina corresponde aos carpelos, em que há o desenvolvimento do óvulo, e a parte masculina produz os grãos de pólen. A partir da germinação, estes grãos vão fecundar o óvulo, formando o zigoto, a semente e, por último, o fruto. Queremos entender melhor o desenvolvimento da parte masculina e, para isso, desenvolvemos uma série de estudos que envolveram a identificação de genes expressos no estame, a estrutura da planta que forma os grãos de pólen -, atesta Márcio.
Segundo ele existe, agora, um grande número de genes que precisa ser identificado. “Uma aluna de doutorado, por exemplo, trabalha com dois genes que são expressos no início do desenvolvimento do estame. O curioso é que a expressão destes genes é restrita a esta estrutura. Mais tarde, poderemos regular a expressão deles e, com isso, evitar a formação do estame. Aí entra a questão do fluxo gênico”, continua o professor.
Fluxo Gênico
Esse processo se caracteriza pela passagem de genes de um indivíduo para outro. Caso haja uma soja transgênica, por exemplo, é importante que não exista a passagem, através da reprodução, dos genes transgênicos para outras plantas não manipuladas. Estas sementes podem germinar em qualquer lugar, gerando o espalhamento deste cultivo. O principal impacto ambiental da transgenia está relacionado ao fluxo gênico.
Conseqüências ambientais
Atualmente, a manipulação genética produz plantas resistentes a insetos, por exemplo. Em um primeiro momento, não há nenhum problema nisso. Somente os insetos que atacarem aquela produção serão afetados. Caso o gene “inseticida” escape para outros vegetais fora da área de cultivo, gerará um grande impacto ambiental. Afinal, a planta, sem controle de produção, contém uma característica que deveria ser exclusiva das plantas do campo.
Os agricultores orgânicos são contra os transgênicos, e ele têm total liberdade de recusar os vegetais geneticamente modificados. Se um cultivo próximo ao seu contiver plantas deste tipo, seus grãos de pólen podem viajar até a produção orgânica. Então, este agricultor terá em seu lugar plantas modificadas sem mesmo saber.
“Nosso trabalho, agora, se destina a estudar o promotor dos dois genes que existem no estame da planta, verificar se eles realmente têm expressão restrita à estrutura que forma o grão de pólen, e também verificar se ele pode ser utilizado em outras espécies. Assim, evitaremos que diversas espécies desenvolvam o estame e, em conseqüência, os grãos de pólen”, esclarece o professor. “Essa supressão será interessante, especialmente, em espécies cuja parte aproveitável não sejam os frutos ou sementes. Do eucalipto, por exemplo, se extrai o tronco, a madeira. Podemos desenvolver uma árvore transgênica que não produza grãos de pólen, e não semeará estes genes”, continua Márcio.
Outra estratégia estudada no laboratório é, também, a apomixia. Trata-se da produção de sementes sem que haja fecundação. Neste caso, algumas células do óvulo se modificam e produzem um embrião, sem necessidade do grão de pólen. Passando para os mamíferos, isso significa a independência completa do sexo feminino. “Por que isso é importante? Se evitarmos a fecundação, evitaremos também o fluxo gênico. Esta estratégia, apesar de mais completa, por se adequar a todos os tipos de vegetais, é também a mais complexa, porque envolve a compreensão de muitos genes”, atesta professor.
O objetivo da pesquisa é, no futuro, passar este conhecimento para espécies importantes economicamente, de forma a melhorar a segurança dos cultivos transgênicos e evitar conseqüentes danos ambientais.