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Edição 226
29 de julho de 2010
A série Por uma boa causa sobre os impactos da prática esportiva na saúde física e mental do atleta chega ao fim trazendo a tona a preparação psicológica para o desempenho esportivo. Mesmo ainda encarado com ressalvas entre profissionais dos desportos, principalmente em modalidades mais conservadoras como o futebol, o trabalho do psicólogo junto aos atletas ganhou espaço em clubes e federações nas últimas duas décadas, refletindo a evolução da ciência e sua aplicação prática.
Diante da enorme pressão por resultados, endossada pela expectativa de torcedores e patrocinadores, cabe ao psicólogo compreender as necessidades do esportista e orientá-lo tendo em vista a melhor maneira de lidar com o estresse e demais questões emocionais. Porém, a desconfiança quanto ao trabalho de psicólogos pôde ser exemplificado quando, no início do ano, o então treinador do Palmeiras Muricy Ramalho dispensou a equipe de psicólogos que atuava no clube há cerca de dez anos. Evidenciando que mesmo hoje, em alguns casos, a função do psicólogo não é bem compreendida dentro do esporte e treinadores acreditam estar capacitados para desempenhá-la.
Contudo, os psicólogos estão cada vez mais presentes na formação de equipes multidisciplinares ― composta por nutricionistas, fisiologistas, fisioterapeutas, entre outros profissionais das ciências da saúde ― para o treinamento desportivo. A Psicologia do Esporte exerce a clínica, a investigação e a educação em um trabalho a médio e longo prazo. Estuda os fatores emocionais que afetam o desempenho dos atletas e os efeitos do esporte para o bem-estar do indivíduo e trabalha no atleta o desenvolvimento interpessoal, concentração, ansiedade e motivação.
De acordo com o psicólogo Guilherme Pineschi, professor do Instituto de Psicologia (IP/UFRJ), o treinamento de habilidades psicológicas ou treinamento mental visa a permitir que o esportista atinja ― com regularidade ― as condições ideais de rendimento através da aprendizagem e do desenvolvimento de habilidades mentais. “É uma modalidade de intervenção psicológica que faz parte do arsenal técnico da Psicologia do Esporte, da mesma forma que a ‘psicologia clínica aplicada ao esporte’. No entanto, diferencia-se desta última: é essencialmente voltado para o contexto esportivo e otimização do rendimento e pressupõe foco educacional e relação psicopedagógica entre treinador mental e atleta.”
Ao contrário do que boa parte dos leigos cree, a atuação do profissional da Psicologia Esportiva não se limita a “apagar incêndios” em situações de crise, trazendo soluções imediatas em um único encontro quando ocorre algum problema pontual. “Um programa de treinamento mental envolve várias sessões e compreende três etapas principais: formação, treinamento e aplicação. A formação consiste na aprendizagem de diferentes técnicas de treinamento mental ― através da realização de exercícios ― e na identificação dos procedimentos que atendem às necessidades do esportista em cada uma das habilidades psicológicas incluídas no programa”, conta Pineschi.
E complementa: “já o treinamento responde pela repetição das técnicas escolhidas, operacionalização, automatização e integração dos procedimentos à rotina de treino e competição. A fase de treinamento abrange o treinamento dirigido (com a presença do treinador mental) e o treinamento pessoal (desacompanhado, realizado no período entre duas sessões de treinamento dirigido). Na etapa de treinamento, a autonomia do esportista é reforçada para que ele seja capaz de contar consigo mesmo. Por fim, o estágio de aplicação refere-se à utilização, durante as competições (contexto estressante), das técnicas de treinamento mental aprendidas e treinadas.”
O professor avalia que entre as habilidades esportivas que podem ser incluídas em um programa de treinamento mental fundamental para atletas consagrados que se encontram numa zona de conforto estão “o estabelecimento de metas (fixação de objetivos, pensamentos e comportamentos), relaxamento (controle da diminuição do tônus), dinamização (aumento de energia quando o atleta não está suficientemente ativado para atuar de forma eficaz em treinos e competições), diálogo interno positivo (pensamentos que favorecem a motivação e dirigem o comportamento) e concentração (focalização da atenção e sua manutenção o processo de execução da tarefa).”