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Edição 217
27 de maio de 2010

Faces e Interfaces

Pesquisa revela que não fumantes engordam menos


Bruno Motta e Michelly Rosa

Pesquisadores da Universidade de Navarra, na Espanha, chegaram à conclusão de que os ex-dependentes do cigarro e os fumantes, respectivamente, têm mais facilidade em ganhar peso. Após acompanhar 7.565 pessoas durante 50 meses, os pesquisadores concluíram, ainda, que as pessoas que nunca haviam fumado engordaram menos.

O Olhar Vital convidou os especialistas dr. João Regis Carneiro e o professor José Egidio de Oliveira, do Serviço de Nutrologia do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, além do dr. Alberto Araújo, diretor do NETT (Núcleo de Estudos e Tratamento do Tabagismo), para discutir os resultados da pesquisa. 

João Regis Ivar Carneiro e José Egidio Paulo de Oliveira

Médico do Serviço de Nutrologia do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho e Professor Titular do Serviço de Nutrologia do HUCFF, respectivamente.

“Existem algumas evidências de que alguns componentes do cigarro, entre eles a nicotina, poderiam interferir no metabolismo, aumentando o gasto calórico e favorecendo a perda ou dificultando o ganho de peso. Também existem trabalhos científicos indicando um efeito da nicotina no tubo digestivo e no sistema nervoso central que poderiam modular o controle de peso do ser humano.

Sabe-se que o hábito de fumar afeta também o paladar dos fumantes e isso pode distorcer de alguma forma o prazer associado à ingestão de determinados alimentos.  Muitas questões permanecem sem resposta, sobretudo pelo fato de que o cigarro apresenta em sua composição uma quantidade muito grande de componentes que podem exercer efeitos ainda desconhecidos no organismo humano.

A cessação do hábito de fumar pode ser fator de risco para o ganho de peso. A melhora do paladar e a sensação de ansiedade gerada pela falta de nicotina podem, sobretudo em indivíduos ansiosos, com tendência para depressão ou compulsão, favorecer o desenvolvimento de um comportamento alimentar inadequado acarretando, assim, o ganho ponderal. Os fumantes com tendência para engordar ou que já estejam acima do peso devem pensar uma estratégia de controle de peso durante o processo de abandono do vício. O acompanhamento com equipe multidisciplinar (médico, psicólogo, nutricionista, profissional de educação física) deve ser estimulado.

Sabemos que as doenças cardiovasculares e o câncer constituem a principal causa de mortalidade no mundo.  O excesso de peso é um fator de risco para o desenvolvimento de hipertensão arterial, diabetes, dislipidemias (aumento do colesterol) e, consequentemente, incrementa o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares.  O tabagismo também aumenta o risco de desenvolvimento de hipertensão arterial e pode interferir negativamente no perfil lipídico (valores do colesterol) dos fumantes.

Fumar aumenta de fato o risco de desenvolver doença cardíaca. Além disso, hoje está  comprovada a associação entre obesidade e determinados tipos de câncer (mama, endométrio, ovário, próstata, cólon, vesícula e fígado). O cigarro contém diversos componentes que podem aumentar o risco para esses e outros tipos de câncer. Sendo assim podemos considerar que o excesso de peso e o tabagismo de maneira sinérgica contribuem para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (AVC, angina, infarto) e de neoplasias. Além disso, ambas as condições podem repercutir negativamente na função pulmonar e, também, na questão social, uma vez que fumar está cada vez mais fora de moda e que infelizmente temos observado um grande crescimento do preconceito contra os obesos no mundo moderno.” 

Alberto Araújo


Médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) e diretor do NETT (Núcleo de Estudos e Tratamento do Tabagismo)


“O ganho de peso é uma das barreiras na tentativa de parar de fumar, principalmente em mulheres jovens. No NETT, a maioria das mulheres que procuram tratamento está na faixa dos 44 anos, nesse caso, a preocupação com o ganho de peso não é prioridade, mas, sim, problemas maiores como depressão, falta de controle do estresse etc. 

A Nicotina acelera o metabolismo do fumante, ou seja, ele fica mais ágil, queima gordura mais rápido. Quando se inicia o tratamento contra o tabagismo, o metabolismo se reduz fazendo com que o ex-fumante queime menos caloria, podendo assim aumentar o peso. 

O prazer proporcionado pela nicotina também atrapalha a alimentação. A dopamina, liberada por receptores ativados pela nicotina, ativa o prazer e dá a sensação de saciedade. Isso faz com que o fumante perca a vontade de comer, pois já está saciado. 

O fumo altera os sentidos, principalmente o olfato e o paladar. No momento em que se para de fumar, esses sentidos se acentuam, ou seja, a comida fica mais saborosa. Além disso, o ex-fumante tem sempre a necessidade de ter algo na mão e na boca, parar compensar o hábito de estar sempre com o cigarro. 

Um dos maiores inimigos do fumante na luta contra o tabagismo é o álcool. Além de auxiliar no acúmulo de gordura, o fumante associa a bebida alcoólica ao cigarro. O resultado disso é que o motivo mais recorrente para as recaídas nos primeiros quatro meses de abstinência é a bebida alcoólica. 

Entre 60 e 70% das pessoas que chegam ao NETT procurando tratamento contra o tabaco são consumidoras de bebida alcoólica. E grande parte já está  acima do peso. 

Na média, as pessoas que param de fumar engordam de quatro a cinco quilos. Porém, esse aumento de peso pode ser apenas uma reposição da massa corporal perdida pela alimentação desregulada durante o período em que se fumava. Além disso, após um ano a pessoa passa a recuperar o peso ideal. 

A questão do aumento de peso deve ser estudada junto aos hábitos alimentares do ex-fumante. Qualquer pessoa deve ter hábitos alimentares saudáveis, evitar o sedentarismo para manter o peso ideal. 

Criou-se um mito nessa questão do ganho de peso como prioridade na escolha entre parar de fumar ou não. Porém, os benefícios de parar de fumar são sempre mais importantes na vida do ex-fumante. Não há comparação entre ganhar alguns quilos e melhorar absurdamente a qualidade de vida”.

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