Entre 2003 e 2009, segundo análise do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), os brasileiros passaram a comer mais peixe. De acordo com os dados recolhidos, nos últimos sete anos, o aumento foi de 40%: de 6,46 kg, em 2003, o consumo subiu para 9,03 kg por habitante/ano, em 2009. Conforme a pesquisa, isso totalizaria um volume anual consumido pela população brasileira de 1,7 milhão de toneladas de pescado.
Diante dessa afirmação, uma pequena conta: a população brasileira tem cerca de 191 milhões de habitantes (dados do censo de 2010), se houve o acréscimo no consumo para 10 kg/ano, por habitante, isso geraria a necessidade de 1,91 milhões de toneladas/ano de carne de pescado disponível no mercado, situação pouco cabível para o professor Marcelo Vianna, chefe do Laboratório de Biologia e Tecnologia Pesqueira, do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
De acordo com Vianna, segundo o último Boletim Estatístico da Pesca e Aquicultura, disponibilizado pelo MPA, a produção nacional de pescado foi de 1,16 milhões de toneladas, em 2008. Se esse raciocínio da pesquisa apresentada pela MPA estiver correto, diz ele, “teremos que aumentar a nossa produção de pescado em quase 40%, só para atender a demanda interna”. “Há que se ter cuidado na hora de avaliar esses valores divulgados pelo MPA”, avisa o professor.
Na verdade, segundo ele, os dados representam, em parte, uma melhoria no controle estatístico da captura e desembarque de pescado, que hoje é realizado por meio de um Acordo de Cooperação Técnica entre o IBGE e o MPA, na coordenação do Sistema Nacional de Informações de Pesca e Aquicultura. “Não necessariamente está se comendo mais pescado, mas, sim, estamos conhecendo melhor essa relação”.
Entretanto, o professor admite que, realmente, existe uma procura maior da população em geral pela carne de pescado, “principalmente pela a população de maior poder aquisitivo”, afirma ele. Contudo, alerta: “esse crescimento no consumo deve ser tratado com atenção. Não há como fomentar um aumento na captura, para acompanhar a demanda, sem estudos prévios”.
“Grande parte dos pescados avaliados encontravam-se plenamente explorados ou sobre-explorados e os poucos estoques apontados como promissores ainda demandam de avaliação mais precisa”, afirma Vianna, com base em uma pesquisa do Ministério do Meio Ambiente, publicada em 2006. Para ele, isso significa que há que se ter muito cuidado ao se fomentar o aumento da captura devido ao risco de colapso eminente das pescarias.
Apesar disso, continua-se consumindo, e consumindo, principalmente, o que pescamos em maior abundância. E isso não é um panorama apenas nacional. “É muito pescado e não acredito que tenhamos como produzir isso. A solução está em abordar o problema a partir de uma visão ecossistêmica e interdisciplinar que inclua estratégias econômicas, tecnológicas, ambientais e acadêmicas”, declara.
Panorama brasileiro e Soluções
Nos últimos anos, segundo o professor Marcelo Vianna, do Departamento de Biologia Marinha, do Instituto de Biologia da UFRJ, a população brasileira come basicamente peixes nacionais, sobretudo, a sardinha-verdadeira, o bonito-listrado, a corvina e as tainhas e pescadas, sendo que os dois primeiros após o enlatamento.
Quanto ao que vem de fora, ele afirma que o Brasil em 2009, importou US$ 689 milhões, o que resultou em um déficit na balança comercial de pescado de US$ 519 milhões. “Trouxemos principalmente o que não produzimos, como o salmão e o bacalhau, mas importamos também outros pescados frescos para compensar o aumento da demanda”.
Dessa forma, para dar conta do atual aumento do consumo, o professor declara que inúmeras medidas devem ser tomadas e todas, em sua opinião, em caráter emergencial. Inicialmente, ele ressalta a necessidade de se consumir pescados de menor nível trófico (os primeiros na cadeia alimentar – herbívoros), sejam estes provenientes da pesca extrativa ou do cultivo. “Ter uma dieta baseado em carnívoros tem um custo ambiental muito alto”, ele afirma.
Além disso, para Vianna, são, fundamentalmente, necessários recursos para pesquisar, com cuidado, os estoques potenciais, antes de direcionar capturas indiscriminadas. Outro agravante, segundo ele, é a captura da fauna acompanhante nas pescarias tropicais, que deve ser combatida fortemente. “Para cada quilo de camarão que chega ao mercado, cerca de 10 quilos de outros organismos, capturados junto e sem valor comercial (muito jovens de pescados comerciais), são mortos e devolvidos ao mar”. Diante de uma situação de aumento de demanda, há que evitar o desperdício.