Em tempos de preocupação com o superaquecimento do planeta e o abastecimento de água para os próximos anos, surge enfim uma alternativa à agricultura a partir de uma planta bem conhecida pelo brasileiro: o café.
Uma pesquisa realizada pelo Laboratório de Genética Molecular Vegetal do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e Laboratórios na Alemanha e Argentina, analisou genes de sementes do café responsáveis pela grande resistência da planta a grandes períodos de estiagem e, a partir disso, tornou possível o desenvolvimento de sementes de outras espécies com a mesma característica.
O estudo é resultado de um trabalho de seis anos em laboratório, realizado na UFRJ pela aluna de doutorado no Instituto de Biologia da UFRJ, Fernanda Cruz.
Foi necessário dividir a análise em etapas. Desde a busca dos genes do café, que poderiam estar envolvidos com a tolerância à falta de água, até a comprovação experimental do resultado e, por fim, a aplicação do resultado, a partir de transformação genética em uma planta modelo, garantindo a importância do gene para controle do estresse hídrico. O resultado reverberou em plantas mais resistentes a períodos de estiagem e à salinidade do solo.
Os benefícios da descoberta atingem desde a ciência ao comércio. De acordo com Marcio Alves Ferreira, professor do Instituto de Biologia da UFRJ e orientador da pesquisa, a possibilidade de desenvolvimento de mais plantas resistentes a esse tipo de ambiente através de melhorias convencionais ou da transgenia é somada aos benefícios direcionados à agricultura, à população e ao comércio:
“A obtenção de tais cultivares pode ser benéfica a agricultores vitimados por estiagens ou secas. Além disso, regiões que a princípio, não são propícias ao cultivo de algumas plantas, podem vir a ser utilizadas, como o semiárido brasileiro e regiões com alta salinidade no solo. Para a população em geral, plantas mais resistentes a secas podem levar a uma maior estabilidade nos preços, pois evitariam altas repentinas por contas de eventos climáticos”, explica.
Andamento do estudo
Em breve serão realizados testes em sementes de soja, cana de açúcar e algodão. Porém ainda há uma grande jornada até as sementes modificadas chegarem aos cultivos.
Segundo o biólogo, por consumir café durante muito tempo, o risco de essas sementes modificadas apresentarem risco ao ser humano é quase nulo. Apesar disso, há a necessidade de avaliação sobre possíveis riscos que o cultivo desses transgênicos pode causar ao campo. Por esse motivo, antes de chegar ao consumidor, diversas normas e avaliações devem ser realizadas para garantir que não exista nenhum perigo.
“Somente depois das avaliações é que uma cultiva transgênica pode ser liberada para sua utilização pelo agricultor. Isso não será diferente para as plantas que serão transformadas com o gene de café”, analisa.
Benefícios ao meio ambiente
Dentre os maiores beneficiados com os resultados do estudo está o próprio meio ambiente. É o que explica o professor: “atualmente 70% de toda água utilizada pelo homem é para agricultura. Portanto, a menor utilização na agricultura pode levar à diminuição do impacto da agricultura no ambiente”.
Além disso, com o aumento da temperatura global e o esperado aumento na incidência de secas em todo o mundo, a existência de sementes mais resistentes a esse tipo de situação climática pode evitar grandes problemas, como o abastecimento.
“É sabido que a elevação da temperatura global vai levar a acentuação dos efeitos de eventos climáticos críticos, tal como secas em várias regiões do planeta. O desenvolvimento de cultivares mais resistentes a estes eventos climáticos ajudará de sobremaneira a mitigação dos problemas gerados pela elevação da temperatura global e ajudará a evitar crises de abastecimento”, revela o biólogo.