Nesta segunda reportagem sobre Planeta Sustentável, tema deste mês, o Por uma Boa Causa trata de substâncias utilizadas no dia a dia dentro das casas: os produtos de limpeza. O cuidado com esses produtos, demasiadamente prejudiciais ao meio ambiente, é necessário em todo o ciclo de seu uso, desde a compra até o modo de como usá-los e descartá-los.
O termo técnico para esses tipos de produtos é “saneantes domissanitários”. Esse termo evoca as palavras latinas domus (lar) e sanitas (saúde), ou seja, “limpeza do lar para manutenção da saúde”. São exemplos comuns de saneantes os detergentes, sabão, amaciantes, cera, polidor, desinfetante, água sanitária, removedor de manchas, xampu e condicionador. Apesar de esses produtos conterem, em seus princípios ativos, substâncias muito diferentes, todos eles prejudicam de algum modo o meio ambiente e o consumidor pela sua composição e pelo uso incorreto.
“Muitos consumidores não têm conhecimento de que esses produtos utilizam componentes químicos muito agressivos à saúde e ao meio ambiente, se mal empregados. Vários vêm com orientações, que frequentemente estão em letras muito pequenas que mal conseguimos enxergar”, destaca o professor Júlio Carlos Afonso, do Instituto de Química da UFRJ.
O professor lista duas consequências do fato: o desperdício pelo uso excessivo, pois assim a peça que está sendo tratada pode sofrer danos que a inutilizem, e a saúde pode ser afetada negativamente. Por exemplo, enjoos, dores de cabeça, vômitos, erupções, alergias, tosse, irritação na pele e nas vias respiratórias, tonteira são alguns sintomas.
“Mesmo considerando que haja subnotificações, os produtos de limpeza são a segunda maior causa de intoxicação no país, perdem apenas para os agrotóxicos. Nos Estados Unidos, onde a notificação é obrigatória, os saneantes domissanitários só perdem para os medicamentos. As crianças são as maiores vítimas, pois são atraídas pela aparência cativante de muitas das embalagens desses produtos. Não são raros os casos de morte”, aponta o professor.
A orientação fundamental para prevenir acidentes desse tipo é que se mantenham os produtos de limpeza fora do alcance das crianças e animais domésticos, e também bem longe de bebidas, alimentos, medicamentos e cosméticos, para não serem confundidos. Ler o rótulo do produto antes de usá-lo é recomendável, pois “as informações mais importantes estarão lá”, aconselha o químico.
O descarte é outro ponto que merece atenção. A embalagem vazia, normalmente de plástico, pode, a princípio, ser destinada à coleta seletiva para reciclagem, desde que ela esteja bem lavada por dentro, segundo o especialista. “O manuseio de uma embalagem suja por parte do reciclador pode causar danos à sua saúde. Não se deve reaproveitar a embalagem para reuso, pois, mesmo após a lavagem, resíduos do produto antigo podem interagir com o produto novo, prejudicando sua eficiência ou mesmo levando a uma reação química inesperada com o tempo, com formação de produto tóxico”, alerta Júlio Carlos.
Quanto ao produto em si, deve-se considerar o caso em que ele perde a validade ou a eficácia. Não se tem uma posição clara na lei, como informa o professor, indicando o que fazer com produtos de limpeza vencidos – como, por exemplo, devolver ao fabricante. “Isso deveria ser objeto de estudos por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Então, a solução menos pior seria descartar em aterros sanitários licenciados, contudo poucos municípios brasileiros dispõem desse tipo de aterro”, diz Júlio Carlos Afonso.
Ao escolher o produto na hora da compra, o consumidor não deve se deixar iludir com as promessas de slogans como “limpeza poderosa”. O professor orienta não adquirir produtos que apresentem apelos de cor, embalagens no formato de figuras que despertem o interesse de crianças e que sejam fáceis de abrir. É prudente também evitar a aquisição de produtos do mercado informal, no qual há empresas não legalizadas, que não passam pela fiscalização dos órgãos federais e de vigilância sanitária.
Dados, apresentados por Júlio Carlos, de estudos conduzidos pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em 2010 revelam que o grau de clandestinidade é elevado: 42% das águas sanitárias consumidas não são regularizadas, assim como 30% dos desinfetantes e 15% dos amaciantes. “Se há princípio ativo em demasia, o risco de intoxicação (especialmente por inalação) aumenta sobremodo, e com teores abaixo do especificado, o produto é simplesmente ineficiente”, informa.
Limpeza saudável
Existem alternativas para os saneantes domissanitários. O emprego de métodos físicos de limpeza com vassouras, aspirador de pó e pano de pó reduz a necessidade do uso de produtos de limpeza. Outra medida é usar produtos naturais e práticas de limpeza utilizadas no passado. “Água com sabão (de coco, de pedra ou neutro) é uma forma de limpeza saudável e é bem antisséptica. O vinagre serve bem para uma limpeza pesada. O cheiro característico inicial logo desaparece, e é um excelente desinfetante”, exemplifica.
Pode-se ainda recorrer ao suco de limão, ao bicarbonato de sódio com água quente, a uma solução diluída de álcool. Os odores desaparecem. A cera menos agressiva para pisos e assoalhos é a de carnaúba. “Outros produtos naturais são os preparados com cera apícola, sabão com um pouco de areia, produtos de fermentação láctea e tensoativos de óleos vegetais. Para pisos frios, pode-se utilizar o anil. Para limpar e lustrar móveis, utiliza-se uma parte de suco de limão e duas partes de azeite de oliva ou vegetal. Produtos naturais para tirar manchas incluem leite, vaselina, glicerina, creme de barbear, solução de cloreto de sódio e óleo de linhaça”, ensina o professor.
Ainda há a opção dos produtos de limpeza ecológicos, sem o uso de derivados de petróleo. Nesse caso, são recomendáveis os produtos que tenham selo de certificação, que indica que a empresa passou por uma auditoria sobre os processos e matérias-primas utilizados, “pois as alegações ‘natural’, ‘verde’ e ‘seguro para o uso’ podem não ser inteiramente verdadeiras”, conclui o especialista.
Casos urgentes
Em casos de suspeita de envenenamento, deve-se entrar em contato urgente com um centro de intoxicação. No Centro de Controle de Intoxicações de Niterói, localizado no Hospital Antônio Pedro, através dos telefones 2717-0148/2717-0521/2629.9021. No Rio de Janeiro temos o Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIAT), que funciona no HUCFF, e, em São Paulo, o Hospital das Clínicas dispõe de um serviço gratuito e atende 24 horas, por meio do número (0xx11) 0800-148110. Há também o Centro de Intoxicação da Anvisa (0800-722-6001).